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sexta-feira, 15 de maio de 2009

Álvaro Brasileiro - um camarada, um amigo

Por: SérgioRibeiro (*)

Assim me disseram pelo telefone. Ontem. E tudo o resto, todas as notícias, todos os pequenos acontecimentos (grandes que eles fossem), tudo o que preenche os dias se apagou perante a brutalidade do telefonema. Que nem sei se agradeci como o devia ter feito.
Desde ontem, anda comigo a lembrança que me trouxe a morte do amigo, do camarada, um dos casos em que escolho a ordem alfabética para dizer o que o Álvaro era para mim. Um amigo, um camarada. Um amigo camarada, um camarada amigo.

Conhecemo-nos em Caxias, ambos com 27 anos que no mesmo ano nascemos. Era, o Álvaro, um dos três de Alpiarça - com o Abalada e o Arraiolos - mais velhos. Sim, porque os outros três - o Machado, o Marvão, o Raposo/"Facalhim", que também recentemente morreu sem que lhe tivesse dado o abraço de que estávamos em falta há 45 anos - andavam próximos dos 20.

Calmo, ponderado, consistente, assim o conhecemos. E à Justina, que víamos através das redes das visitas, sempre a companheira.

Depois, foi a vida e a luta que nos fizeram encontrados tantas vezes. Sempre o amigo, sempre o camarada. Nas campanhas de 1969 e 1973, na revolução por que lutáramos. Às vezes em convívios no meloal, ou em sua ou em minha casa, só porque nos sentíamos bem juntos. Como amigos. E camaradas, sempre.

Na Assembleia da República, o nome do Álvaro Brasileiro, eleito pelo distrito de Santarém, está inscrito - queiram-no ou não os historiadores encartados - como um dos mais prestigiados deputados, um que, entre "doutores e engenheiros", se fazia respeitar como operário rural, como seareiro, que sabia o que queria e sabia do que falava, que chegou a presidente da comissão de agricultura, não por arranjos e conluios mas por indiscutível mérito.
Tive a sorte de partilhar com ele os dois mandatos por Santarém, no curto período em que coincidimos na AR. Foi dos tempos mais ricos da minha actividade parlamentar. Ao Álvaro Brasileiro o agradeço! Como nós trabalhámos em perfeita cooperação, apenas com a finalidade de estarmos ali ao serviço dos interesses de quem representávamos! E fizemos, os dois, uma inesquecível volta a quase todos os concelhos de Santarém, prestando contas do que fizéramos em representação do povo do distrito.

Nunca deixámos de nos encontrar e abraçar e conviver, com ou sem pretextos. Só mais dois episódios que ajudarão a transmitir, nestas magoadas palavras, o que sinto. Um, lembrando a tão sintomática situação de ter tido de ser, há poucos anos (muito depois de 1974!), testemunha de defesa (abonatória) do Álvaro, num tribunal, por ele ter co-assinado um documento político, o que o levou, com outros camaradas, àquela situação, a ele que fora julgado pelos tribunais plenários do fascismo, tal como eu o fui; outro episódio foi o da alegria que ele me deu ao aceitar apresentar o meu último livro em Alpiarça.
O 50 anos de economia e militância teve, em Álvaro Brasileiro, o amigo e o camarada que deu o testemunho mais claro e insofismável do que foi a luta militante (e na economia produtiva) deste meio século que atravessámos. Com as nossas fragilidades mas com as nossas convicções e determinadas vontades. Esta luta que continua, Álvaro. Sem que estejas ao nosso lado, mas continunado connosco. Com o teu exemplo.

(*) Economista, Membro da DORSA do PCP, Antigo Deputado na AR, Antigo Deputado no Parlamento

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