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sábado, 24 de abril de 2010

O 25 de Abril de 1974 – uma revolução para as mulheres

Por: Lily Nobrega Guilherme *

O 25 de Abril de 1974 é para as mulheres portuguesas um acontecimento histórico, marcante para o reconhecimento de direitos fundamentais e por um aspecto essencial que só os períodos revolucionários permitem alcançar – a vivência quotidiana do exercício desses direitos que, no caso das mulheres, correspondeu a uma explosão de intervenção massiva até então inédita: da participação política à sindical, da gestão de escolas a cooperativas, no acesso às novas profissões e carreiras – o assumir da palavra e da acção em liberdade.

Foram abolidas situações humilhantes a que o fascismo sujeitou as mulheres; registou-se uma radical alteração na sua situação de facto e no plano jurídico, alteração que lhes reconheceu direitos económicos, sociais, políticos e culturais. Conquistou-se o direito de participação em igualdade em todas as esferas da vida.

Foram implementadas medidas revolucionárias na área do trabalho, da segurança social, do direito da família, de protecção à maternidade e paternidade. Destacam-se pela sua importância a fixação do salário mínimo nacional (Maio/74); o aumento generalizado de salários; a garantia de emprego; a consagração de férias, subsídio de férias e de Natal; diminuição das diferenças salariais; a abertura às mulheres das carreiras da magistratura judicial e do Ministério Público (Dezembro/74); da carreira diplomática (Julho/74) e a todos os cargos da carreira administrativa local (Junho/74); a abolição de todas as restrições baseadas no sexo quanto à capacidade eleitoral dos cidadãos (Novembro/74); a alteração do artigo da Concordata, passando os casamentos católicos a poderem obter o divórcio civil (Abril/75); a abolição do direito do marido abrir a correspondência da mulher (Junho/76); a revogação das disposições penais que atenuavam as penas aplicadas aos homens ou despenalizavam os crimes em virtude das vítimas desses delitos serem as suas mulheres ou filhas(Maio/75).

Foram tomadas medidas que asseguraram o direito à Segurança Social à grande maioria das mulheres, em especial das trabalhadoras e reformadas até então excluídas desse direito.
As trabalhadoras viram reforçados os seus direitos em situação de doença, de desemprego e na velhice, destacando-se a instituição de um valor mínimo para a pensão de invalidez e de velhice do regime geral (igual a metade do salário mínimo nacional).
Para as mulheres agrícolas do Sul, a Reforma Agrária assegurou o acesso ao trabalho, à realização profissional e à sua independência económica.

Foi generalizado o acesso das mulheres ao acompanhamento médico durante a gravidez e o parto e instituído o direito ao parto hospitalar, pondo fim a uma realidade em que 43% dos partos ocorriam em casa (17% dos quais sem assistência médica) e em que muitos distritos não tinham maternidade. A consagração do Serviço Nacional de Saúde (SNS) (1979) deu uma significativa resposta à defesa do direito à saúde das mulheres ao longo do seu ciclo de vida.

A Revolução de Abril constitui um marco decisivo no acesso à participação desportiva das raparigas e mulheres portuguesas que, na sua esmagadora maioria, se encontravam afastadas de qualquer tipo de participação desportiva, quer por serem proibidas de integrar, ou de eleger, os corpos sociais de clubes e associações, quer por também lhes ser proibida a prática de inúmeros desportos.

Com a instauração das liberdades e da democracia, as comemorações do 8 de Março – Dia Internacional da Mulher – representaram uma oportunidade para dar maior visibilidade à situação herdada do fascismo e inscreveu-se numa profunda dinâmica de participação das mulheres em todo o processo revolucionário. Coube ao MDM – Movimento Democrático de Mulheres – a dinamização das acções comemorativas desta data, logo em 1975 – a primeira comemoração em liberdade e democracia.

Passou a ser possível a dinamização de reuniões, debates, comícios onde as mulheres tomavam a palavra, verbalizando os seus problemas, tomando consciência do seu papel na transformação da situação de subalternidade a que o fascismo as sujeitou, ganhando confiança nas suas capacidades e no seu papel para mudar a sua vida e a vida colectiva.

A realização de convívios, de acções de carácter cultural e desportivo deram um forte impulso à participação das mulheres nos diversos domínios da sociedade portuguesa, onde pulsava a Revolução e a acção transformadora da realidade. A valorização dos saberes das mulheres através de exposições dos seus trabalhos (trabalhos manuais, artes plásticas, etc.), as acções de valorização do papel das mulheres nas comunidades, no cinema, ou no teatro, representam também um importante património das comemorações do 8 de Março após a Revolução de Abril. As acções que expressaram a solidariedade entre mulheres no mundo, na luta contra a guerra e pela paz entre tantas outras.

Contudo, nas últimas três décadas, a evolução da situação das mulheres no trabalho e na sociedade evidencia o agravamento das injustiças sociais e a continuada perpetuação do «tradicional» ciclo de discriminação em função do sexo, o que pesa sobre a sua situação no trabalho – seja das jovens, seja das que têm um percurso profissional consolidado – e se repercute na sua vida familiar e na sociedade em geral.

A acelerada degradação das condições de vida e de trabalho das mulheres, resultante da política de direita, transporta consigo «o germe» da desigualdade social, da discriminação em função do sexo e do incumprimento do direito à sua participação em igualdade em todas as esferas da vida nacional.

Nas últimas décadas aprofunda-se a contradição insanável entre a aspiração da larga maioria das mulheres em exercer direitos, em participar em igualdade, em afirmar os seus saberes e capacidades no plano profissional e social, em ser mãe e trabalhadora com direitos, a viver a velhice com dignidade, e os malefícios das continuadas políticas de direita que as empurram para condições de vida e de trabalho cada vez mais adversas, num país cada vez mais desigual e injusto.

Celebrar hoje a Revolução de Abril é contrariar o conformismo, a passividade e a perda de memória. Cada vez mais, nas empresas, nos campos, na rua, nos sindicatos, em casa, nas relações com a família, a mulher se afirma voltada para o futuro, numa atitude de construção cuja importância para a defesa da democracia e dos grandes valores da Revolução de Abril criou e continua a inspirar a luta dos trabalhadores e de todas as mulheres que acreditam que é possível e necessária uma sociedade mais participada, mais justa e mais democrática.
Pelo direito à diferença, à criatividade e ao sonho! Pela paz, e pelo Socialismo!
ABRIL DE NOVO!

* Funcionária Politica

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