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segunda-feira, 21 de março de 2011

George Soros dá a receita para a Europa sair da crise

George Soros
"Verdade seja dita, a Alemanha tem estado a resgatar os países altamente endividados como forma de proteger o seu próprio sistema bancário", diz o investidor George Soros, que garante que os países deficitários da Zona Euro ficarão numa posição insustentável se o actual plano delineado para a crise for em frente.
A tão falada crise do euro é normalmente vista como uma crise exclusivamente cambial, mas o facto é que é também uma crise da dívida soberana e uma crise da banca. A situação é extremamente complexa. É assim que o investidor George Soros se refere, num texto de opinião publicado no “Financial Times”, aos actuais apuros da Europa.

Esta complexidade, segundo Soros, alimentou a confusão. “E a confusão tem consequências políticas”. Assim, adverte o célebre investidor, “a Europa enfrenta não só uma crise económica e financeira, mas também uma crise política. Os vários Estados-membros formaram opiniões bastante diferentes e as suas políticas reflectem mais essas opiniões do que os seus verdadeiros interesses nacionais. O confronto dessas percepções comportam as sementes de sérios conflitos políticos”.

Soros sublinha que a solução que está prestes a ser delineada “será efectivamente ditada pela Alemanha”. A França está também a tentar exercer alguma influência, mas acabará por se render à Alemanha porque o seu “rating” ‘AAA’ depende do facto de estar estreitamente aliada aos germânicos, refere o “chairman” e fundador do “hedge fund” Soros Fund Management.

“A Alemanha faz recair as culpas da crise sobre os países que perderam competitividade e que aumentaram fortemente os seus níveis de endividamento. Consequentemente, a Alemanha coloca todo o encargo do ajuste nos países endividados”, relembra Soros. No entanto, o investidor considera que esta é uma perspectiva extremamente tendenciosa, pois ignora o facto de esta não ser uma crise exclusivamente de dívida soberana, já que é também uma crise cambial e bancária – “e a Alemanha tem uma grande quota parte de responsabilidade por estas crises”.

Divergências na Zona Euro

No artigo hoje publicado no jornal britânico, George Soros chama também a atenção para o facto de se ter esperado que a introdução do euro criasse convergência, mas que a verdade é que se assistiu a uma divergência.

“O Banco Central Europeu encarou a dívida soberana de todos os Estados-membros como desprovidas de risco, na sua generalidade”. E aceitou essa dívida na sua janela de desconto, com condições iguais à da restante dívida, sublinha o investidor.

“Os bancos que foram obrigados que foram obrigados a deter activos sem risco para cumprirem os requisitos de liquidez foram induzidos a inundar-se de dívida soberana dos países mais débeis, de modo a ganharem uns pontos base adicionais. Isto fez descer os juros de Portugal, Irlanda, Grécia, Itália e Espanha e deu origem a bolhas imobiliárias – simultaneamente, a Alemanha teve de apertar o cinto para lidar com os custos da reunificação”, relembra Soros.

O resultado foi uma disparidade em termos de competitividade e uma crise bancária que afectou mais os bancos alemães do que a maioria dos restantes bancos, destaca. “Verdade seja dita, a Alemanha tem estado a resgatar os países altamente endividados como forma de proteger o seu próprio sistema bancário”, refere Soros.
Alemanha protege o seu sistema bancário

No artigo do “Financial Times”, o investidor explica que os acordos impostos pela Alemanha protegem o seu sistema bancário ao tratarem a actual dívida soberana activa como sacrossanta. “Além disso, os alemães colocam todo o fardo do ajuste nos países devedores”.

“Estes acordos fazem lembrar a crise bancária internacional de 1982, quando as instituições financeiras internacionais emprestaram aos países devedores dinheiro suficiente para pagarem as suas dívidas até os bancos conseguirem constituir reservas suficientes para trocarem a sua dívida tóxica por obrigações Brady em 1989. Isso levou a uma ‘década perdida’ na América Latina. E agora os actuais acordos penalizam os países devedores ainda mais do que na década de 80 porque eles terão de pagar elevados prémios de risco a partir de 2013”.

UE sofrerá algo mais do que uma década perdida

“Há algo de inconsistente em resgatar uma vez mais o sistema bancário e depois resgatar os detentores de dívida soberana a partir de 2013, através da inclusão de cláusulas de acção colectiva. Em resultado disso, a União Europeia irá sofrer algo pior do que uma década perdida; irá passar por uma divergência crónica, em que os países excedentários seguirão em frente e os países deficitários serão arrastados pelo encargo da dívida que acumularam. As exigências de competitividade serão impostas num terreno de jogo não nivelado, o que deixará os países com défices numa posição insustentável”, alerta George Soros.

“Mesmo Espanha, que mergulhou na crise do euro com um rácio de dívida mais baixo do que o da Alemanha, poderá ser arrastada”, adverte o investidor, que gere também a organização política Open Society Institute.

“Berlim está a impor estes acordos sob uma intensa pressão da opinião pública alemã, mas a opinião pública alemã não sabe a verdade, pelo que está confusa. A solução para a crise do euro que irá ser implementada no final de Março levará a uma Europa a duas velocidades. E isso gerará ressentimentos que colocarão em perigo a coesão política da UE”, sublinha Soros no seu artigo de opinião.
As duas modificações essenciais na proposta de solução para a crise

Na sua opinião, são necessárias duas modificações fundamentais.

“Em primeiro lugar, o Fundo Europeu de Estabilização Financeira tem de resgatar tanto o sistema bancário como os Estados-membros. Isto permitirá reestruturar a dívida soberana sem se precipitar uma crise bancária. A dimensão do pacote de resgate poderá ser a que já foi definida, porque qualquer quantia usada para recapitalizar ou liquidar bancos irá reduzir a quantia que é emprestada aos Estados soberanos. Conseguir colocar o sistema bancário sob a supervisão da Europa, em vez de o deixar nas mãos das autoridades nacionais, será uma melhoria crucial, que ajudará a restaurar a confiança”.

“Em segundo lugar, para se criar um terreno de jogo nivelado, terá de ser eliminado o prémio de risco sobre os custos dos empréstimos dos países que obedecem às normas. Isso poderá ser concretizado através da conversão do grosso da dívida soberana em eurobonds; cada país teria, em seguida, que emitir as suas próprias obrigações, com cláusulas de acção colectiva, e pagar o prémio de risco apenas para os montantes que excederem os critérios de Maastricht”.

A primeira medida, salienta Soros, “poderá - e deverá - ser tomada imediatamente: na cimeira europeia desta semana; a segunda medida terá de esperar”. O investidor realça que a opinião pública alemã está ainda longe de aceitar estas medidas. “No entanto, elas são necessárias para o restabelecimento de um terreno de jogo nivelado. E isto tem de ficar claro, para que os países deficitários possam ter esperança de conseguir escapar – se trabalharem arduamente nesse sentido – à situação difícil em que estão metidos”, conclui o investidor.

O sucesso de Soros

Recorde-se que George Soros, que nasceu na Hungria, ficou célebre em 1992, quando apostou na queda da divisa britânica. Ele conseguiu influenciar o mercado, ao dizer que a libra iria perder terreno, levando assim outros investidores a também venderem libras. O Banco de Inglaterra foi obrigado a intervir. Os juros subiram, o Reino Unido saiu do Sistema Monetário Europeu (SME) e a libra perdeu perto de 15%. E Soros ganhou mil milhões de dólares com a sua operação especulativa.

Outros investimentos bem sucedidos de Soros incluem uma aposta na valorização do marco alemão depois da queda do Muro de Berlim e uma aposta na queda das acções japonesas em
1989.
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