.

.

.

.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

E DEPOIS DA CRISE?

Nós, os seres humanos, estamos irremediavelmente aprisionados pelo presente. De tal modo, que até temos a ilusão de que só existe o "agora", confinados às três dimensões do espaço em que nos deslocamos e intuindo apenas o significado da tese de Einstein de que o tempo é, verdadeiramente, uma quarta dimensão. Aspiramos à imortalidade dos deuses, mas somos, afinal, simples mortais e estamos, tal como Sísifo, condenados ao drama existencial de empurrar o nosso "fardo" até ao cume da montanha, para, no fim, o ver cair de novo no sopé.

Na vida política e no governo da cidade, esta prisão é cada vez mais opressiva. O filósofo espanhol Daniel Innerarity escreveu um ensaio – ‘O futuro e os seus inimigos’ – em que identifica como inimigos do futuro "os que o concebem sem levar a sério a sua complexidade e os que o manejam irreflectidamente, quer porque o entendem como mera continuidade quer porque o hipotecam irresponsavelmente". As manifestações de inimizade ao futuro são muito variadas, indo desde o uso inflacionário da palavra até ao sobreendividamento das gerações futuras.

A crise em que vivemos agravou, sem dúvida, este estado de coisas. Oprimidos pelo endividamento e pelo défice, não conseguimos planear o futuro de Portugal para além da necessidade dura e premente de honrar os nossos compromissos internacionais. A "austeridade", passe o eufemismo cruel para os desempregados e mais pobres, não é o melhor ambiente para pensar no futuro. Todos percebemos que o discurso político tem variações ligeiras e, perante a questão mais relevante (como evitar os efeitos recessivos da austeridade?), opta pelo silêncio prudente.

É necessário projectar o futuro. Esse é o primeiro dever patriótico que nos une. Como iremos construir, depois do degelo, o "país crescendo em liberdade, entre medas de trigo e alegria", que Eugénio de Andrade sonhou? É indispensável repensar a economia, assegurar reservas estratégicas nos domínios da agricultura, da pecuária e das pescas, apostar em nichos de qualidade na investigação e na cultura e desenvolver novas indústrias. Os últimos trinta anos revelaram que o crescimento do capital financeiro não basta para tornar Portugal um país viável.
Fonte:«CM»
Enviado por um leitor

Sem comentários: